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Família Portofino,

Com as taxas de juros em 13,25%, provavelmente migrando para 13,75% na próxima reunião do Banco Central do Brasil, no dia 3 de agosto, a recomendação de privilegiar a renda fixa pós-fixada nos portfólios locais tornou-se relativamente óbvia. Quando se fala em alocar nessa categoria de investimentos, estamos falando muitas vezes em substituir o chamado risco de mercado, expresso na variação das taxas prefixadas, juros reais, renda variável e câmbio, por exemplo, por risco de crédito.

Segundo os dados da ANBIMA – Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais – a indústria de fundos de renda fixa captou liquidamente cerca de R$ 200 bilhões nos últimos 12 meses, enquanto os fundos de renda variável e multimercados sofreram resgates próximos de R$ 48 bilhões e R$ 85 bilhões, respectivamente. Essa demanda bilionária por ativos de renda fixa aqueceu o mercado de emissões privadas, incentivando empresas e instituições financeiras a captar via emissão de dívidas. 

Banco Central - Portofino

É essa crescente demanda  de títulos privados no mercado local que nos preocupa. Diferentemente do que se observa no mercado externo, nossa precificação de ativos de crédito tem se mostrado contra cíclica. Em um mercado onde as bolsas de valores caem lá fora em média 20%, os juros vêm sendo elevados bem acima das médias recentes, a inflação se mantém pressionada, onde já está contratada relevante desaceleração da atividade com risco de recessão, o que se esperaria dos preços dos ativos de crédito? Que eles piorassem, certo? Sim, o mercado high yield americano, o qual engloba as empresas com um pouco mais de risco crédito, viu suas taxas pagas acima das do tesouro americano subirem de 2,8% para quase 6% ao ano em 2022.

No mercado local, essa dinâmica tem sido bem diferente. A demanda por títulos privados tem sido tão grande que na prática não se nota a adequação da remuneração das emissões privadas para um cenário no mínimo mais desafiador. O crescimento da economia tem sido revisado para baixo, diversos setores têm tido margens e lucros pressionados, quando listadas na bolsa, valor de mercado das empresas tem sido corrigido significativamente, tudo isso a despeito de correção equivalente na remuneração de suas emissões de dívidas domésticas.

O que deveríamos esperar das taxas pagas por uma debênture cuja empresa viu seu valor de mercado cair quase 70% e seus títulos emitidos no exterior perderam por volta de 20%? Que tivesse algum tipo de ajuste, certo? Errado. Este é o exemplo da debênture da Natura Cosméticos, que apesar do ajuste dos preços das suas ações e bonds no exterior, não se verificou internamente a alteração de preço das suas debêntures. O exemplo da Natura é um de vários que corroboram com a nossa tese de que a crescente demanda por títulos de renda fixa vem distorcendo o prêmio do risco de crédito das emissões de empresas no mercado doméstico. Hoje, é comum encontrarmos papéis emitidos por companhias no exterior que convertidos para CDI remuneram 3%, às vezes 4%, ao ano a mais quando comparados aos emitidos em reais no mercado local.

Nesse ambiente de grandes incertezas onde os juros provavelmente se manterão altos por mais tempo, a estratégia de crédito privado continuará a ter destaque nos nossos portfólios. Entretanto, os spreads comprimidos por questões técnicas distorcem o preço justo das emissões. Temos sido bastante criteriosos na aprovação de novos nomes, preferindo emissões que incluam algum tipo de colateral ou garantia. Por várias vezes, preferimos ficar de fora de algumas emissões mesmo gostando do risco incorrido, porém discordando da remuneração. As emissões externas nos parecem mais premiadas, desta forma também consideramos a alocação de parte da estratégia de crédito privado nessas operações de forma “hedgeada” para reais. Além de não renunciarmos ao carregamento do CDI, acessaremos um mercado onde as taxas estão mais atrativas e ajustadas à realidade do cenário, diferentemente do que observamos localmente.

O risco de crédito no Brasil é por muitas vezes silencioso em função da menor liquidez desses ativos, e pode surpreender via ajuste repentino da marcação a mercado. Desta forma, recomendamos cautela na alocação por impulso. Nestes casos, a análise da remuneração justa e adequada ao risco tem sido parte tão relevante na nossa  análise quanto o próprio escrutínio da capacidade financeira da empresa em honrar o pagamento da dívida.

Até a próxima!

Eduardo Castro

Eduardo Castro é CIO (Chief Investment Officer) na Portofino Multi Family Office.

 ”Causa e Efeito” é um conteúdo exclusivo Portofino MFO que traz uma visão técnica sobre o que acontece no mundo, na semana e seus reflexos nos mercados financeiros globais.