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Família Portofino,

A guerra entre a Ucrânia e a Rússia continua sem uma perspectiva real de cessar-fogo. Ainda digerindo as consequências inflacionárias do pós-pandemia, o mundo se vê atropelado por um novo e intenso choque de oferta, choque este que pressiona ainda mais os preços de energia e alimentos principalmente. Os bancos centrais que já vinham correndo atrás do problema, foram recentemente obrigados a endurecer seus discursos na direção de juros mais altos, contracionistas para crescimento, portanto.

O índice da Bloomberg que replica uma carteira global de títulos de renda fixa, soberanos e corporativos, de mercados desenvolvidos e emergentes, apresenta queda de cerca de 12% desde o seu máximo observado recentemente. Para colocar em perspectiva o tamanho da realização, esse resultado supera os piores momentos da crise financeira mundial de 2008 ou mesmo a queda observada durante o pior da pandemia.

Por outro lado, quando observamos o comportamento dos ativos domésticos, seja o câmbio ou mesmo a bolsa, temos um início de ano surpreendentemente positivo. Quando comparada a uma cesta de mais de 30 moedas de diversos países, o Real é de longe aquela que apresenta o melhor desempenho. No menor nível dos últimos dois anos, a cotação de 4,66 representa uma apreciação frente ao dólar de 19,7% no ano. Já o Ibovespa, na mesma direção, sobe incríveis 16%!

Gráfico demonstra cotação do Dólar em Reais desde 2020. Um bom momento para dolarizar parte do patrimônio.

No mercado financeiro, nos acostumamos a descrever como sendo uma tempestade perfeita, numa analogia aos desastres meteorológicos, momentos de elevação dos riscos que se vêm adicionalmente agravados por uma combinação rara e concomitante de circunstâncias. No Brasil hoje, vivemos uma tempestade perfeita às avessas.

Após ter sido criticado por derrubar nossa taxa de juros básica a inéditos 2% ao ano, o Banco Central do Brasil, como se reconhecendo o erro e seu efeito perverso sobre a taxa de câmbio e inflação, antecipou-se aos seus pares iniciando o ciclo de aumento da SELIC há praticamente um ano. A SELIC encontra-se em 11,75% estando já contratada um aumento adicional de 1% para a próxima reunião de maio. O FED, o banco central americano, só agora em março, iniciou sua estratégia de normalização movendo a banda da taxa básica americana do intervalo de 0%-0,25% para 0,25%-0,5% ao ano.

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Diversas variáveis econômicas combinadas determinam a taxa de câmbio “justa”. Entre elas, sem dúvida o diferencial de juros entre dois países se apresenta como uma das mais relevantes. Os juros brasileiros superam os americanos em mais de 10% e esse diferencial acaba funcionando como um tremendo atrator de fluxo. Em um mundo de juros reais negativos, com a inflação no mundo desenvolvido indistintamente nos piores níveis dos últimos 30 anos ou mais, investir a 12% em uma democracia geopoliticamente estável tem sido considerado pelo investidor estrangeiro como uma alternativa viável.

É crescente o fluxo de investimento em portfólio por parte dos gringos tanto na renda fixa quanto na renda variável. O Ibovespa, por exemplo, já recebeu esse ano mais de US$ 83 bilhões de investidores internacionais, 12% a mais do recebido durante todo o ano passado. O movimento de rotação das carteiras desses investidores na busca por ativos menos sensíveis à elevação dos juros internacionais nos beneficiou.

Adicionalmente, a guerra na Europa forçou a redução de exposição em ações russas. Por serem economias emergentes relativamente comparáveis, as ações de empresas brasileiras tiveram fluxo adicional. A cereja do bolo.

Outro grande contribuidor para o aumento de fluxo financeiro para o Brasil vem sendo nosso saldo comercial beneficiado pela explosão dos preços das commodities. Grãos, petróleo e metais, em especial minério de ferro, já vinham tendo seus preços positivamente influenciados pela retomada da economia mundial. A guerra entre a Rússia e a Ucrânia deu impulso adicional aos nossos termos de troca, beneficiando adicionalmente os preços das nossas exportações.

E os riscos? Do lado doméstico, sempre que falamos de riscos, a irresponsabilidade fiscal, descontrole das contas públicas e aumento da nossa dívida pública em proporção ao PIB sempre aparecem em destaque em qualquer enquete com investidores. Temos que reconhecer que não só a dinâmica fiscal, mas também a da atividade, vêm surpreendendo positivamente. Nosso crescimento superou as estimativas dos analistas tanto no último trimestre do ano passado como vem surpreendendo nos primeiros meses deste ano. No fiscal, nossa arrecadação vem sendo positivamente impactada pelo crescimento das exportações, pelos ajustes dos impostos relativamente corrigidos pela inflação, pelos gastos correntes ainda contidos – ausência de aumento para o funcionalismo, por exemplo – e por mais royalties do petróleo beneficiados pela elevação dos preços. A foto é inquestionavelmente boa apesar das indefinições eleitorais de como terminará esse filme.

Porto seguro, um exagero talvez. Mas, sem sombra de dúvidas, o Brasil se posiciona pelas razões que descrevemos acima, em mundo repleto de incertezas geopolíticas e econômicas, como um candidato natural a continuar recebendo investimentos diretos e financeiros. Por quanto tempo essa janela vai permanecer aberta, é difícil dizer. Mas depois do último semestre do ano passado, onde nos colocamos entre os ativos com pior performance no mundo, é bom tirarmos proveito dessa tempestade perfeita às avessas.

Um ótimo final de semana para você e sua família.

Eduardo Castro

Eduardo Castro é CIO (Chief Investment Officer) na Portofino Multi Family Office.

 ”Causa e Efeito” é um conteúdo exclusivo Portofino MFO que traz uma visão técnica sobre o que aconteceu no mundo, na semana e seus reflexos nos mercados financeiros globais.